Para 91% dos professores brasileiros de 5.º e 9.º anos da rede pública, uma das principais razões para a dificuldade de aprendizagem é o desinteresse dos próprios alunos. No Paraná a proporção é um pouco maior. Conforme mostram as respostas a um questionário enviado às escolas junto da Prova Brasil 2011, 92% dos professores do estado acham que os alunos não aprendem porque não se esforçam. O mesmo questionário revela ainda que a maior parte da categoria não vincula os problemas de aprendizagem ao próprio trabalho, ou sequer à escola.
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Segundo analistas, o resultado preocupa. Por um lado, revela o pessimismo com o qual muitos professores veem a docência ou as capacidades dos próprios alunos. Por outro, mostra a confusão de papéis em relação ao que cabe à família e à escola.
O levantamento se baseia nas respostas dadas por 226,8 mil professores de todo o Brasil e 12,8 mil no estado.
De acordo com a psicopedagoga e doutora em Educação Evelise Portilho, da PUCPR, os números são uma amostra do embate clássico entre pais de alunos e professores. “Se a mesma pesquisa fosse feita com as famílias, elas provavelmente também se isentariam. É sempre mais fácil colocar responsabilidade no outro”, diz.
Evelise diz ser impossível ignorar as consequências desse tipo de visão negativa por parte dos professores no desenvolvimento dos alunos. Não faz sentido, diz ela, empurrar a culpa do mal desempenho somente aos pais. “Não adianta a escola querer que a família faça algo que a ela não está instrumentalizada a fazer”, diz. Haveria ainda uma questão básica nessa relação: “Que parte daquilo que é meu eu não estou fazendo?”.
Desinteresse
O doutor em educação e professor do Núcleo de Pesquisas Educacionais da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Ângelo Ricardo de Souza acha que a motivação dos estudantes, vistos como desinteressados pelos professores, merece um aprofundamento maior. “Cumpre perguntar porque uma condição natural do humano, a curiosidade, não consegue ser aguçada ou desenvolvida pela escola”, sugere.
Ele cogita que a causa do problema se relaciona com a falta de articulação entre o currículo, a prática pedagógica e as necessidades dos alunos, ou ainda às difíceis condições de trabalho dos professores, que tentam ser criativos mesmo com o excesso de demanda. Perguntas sobre rotina profissional também são feitas no questionário, mas apenas uma minoria de docentes aponta esses fatores como causas da dificuldade de aprendizagem.
A realidade como atalho para o conhecimento
Despertar o interesse dos alunos, apesar dos problemas em seu ambiente familiar ou social, virou a especialidade da professora Janisse Córdova Dornelas da Costa, docente da rede municipal de Curitiba. Ela faz parte do seleto grupo de profissionais a ganhar duas vezes o prêmio do Concurso Cultural Ler e Pensar, entregue pelo Instituto GRPCom aos responsáveis pelas melhores iniciativas envolvendo o uso de jornais em sala de aula.
Em 2009, o título foi conquistado com o projeto “O time é do meu coração, a violência não”, iniciativa interdisciplinar dirigida a alunos do 5.º ano. Janisse conta que teve a ideia a partir das constantes brigas ocorridas em sala de aula iniciadas por provocações entre os estudantes sobre times de futebol.
Atenta ao evidente gosto dos alunos pelo tema, ela passou a aproveitar as notícias do jornal sobre os jogos para estimular debates e trabalhos em diversas disciplinas. Para promover uma cultura de não violência, Janisse chamou líderes das torcidas organizadas que enfatizavam a importância de se manter a rivalidade somente dentro de campo.
Em 2011, o projeto que lhe valeu o prêmio foi “Doação de órgãos: ser solidário é dizer sim!”. Segundo a professora, o projeto nasceu de um comentário inusitado na turma, quando um dos alunos comentou que sua mãe possuía apenas um rim, o que deu início a um debate.
Ambos os projetos foram desenvolvidos na Escola Municipal Wenceslau Braz, no Boqueirão, onde Janisse trabalha no período da tarde. Ela conta que boa parte de seus alunos vive em ambientes rodeados por violência e drogas, admite a ausência de muitos pais no acompanhamento das crianças, mas rejeita a tese de que nada pode fazer para ajudá-los no desempenho escolar. “Você tem que se envolver com o aluno, conquistá-lo. É possível garantir uma aprendizagem significativa se entender o mundo deles e usar isso nos conteúdos”, conclui.
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