segunda-feira, setembro 30, 2013

Fé e turismo ganham a estrada

Roberto Custódio / Gazeta do Povo / O Santuário São José, em Apucarana, um dos muitos templos religiosos da Rota da Fé
Parque da Redenção, em Apucarana.


Não é por falta de praias ou paisagens paradisíacas que a região do Val do Ivaí, no Norte do Paraná, não pode atrair turistas. Com belos templos, edificações e parques de temáticas sacras, a região encontrou no turismo religioso uma vocação que deve se transformar em rota formal até janeiro do próximo ano. A ideia ganhou força após o 10º Congresso Internacional de Turismo Religioso Sustentável, realizado em junho, em Apuca­­rana, cidade escolhida para ser o centro da Rota da Fé do Norte do Paraná, que agregará 26 municípios.
Romeiros mudam cenário em Lunardelli
Um dos pontos mais atrativos da nova rota turística deve ser o município de Lunardelli, onde está o Santuário de Santa Rita de Cássia, que costuma atrair milhares de romeiros aos finais de semana. Responsável pela acolhida e liturgia do Santuário, a irmã Petronila Maria Batisti, recorda que, na década de 1990, Lunardelli era uma “cidadezinha se acabando”. “Sem indústrias e sem ter onde estudar, os jovens tinham que ir para fora. Era uma cidade muito pequena, suja e feia.”
A história começou a mudar em julho de 1993, com a chegada do padre João Maria da Rocha Santana, ou Joãozinho, que trabalha na região de Apucarana atualmente. “Ele começou a visitar famílias, e o pessoal pediu uma novena no dia 22, que é dia de Santa Rita. O padre acolheu e começou a fazer a novena às 15 horas. O comércio e as escolas fechavam para acompanhar, era uma novidade na cidade”, relata.
Aos poucos, a novena passou a atrair tantos fieis da região, que precisou ser transferida para a noite, para não causar problemas no andamento das atividades escolares. Com a ajuda do Sebrae, a movimentação na paróquia – elevada a Santuário há dois anos – virou alternativa de renda para a população.
Evolução
Com pouco mais de 5 mil habitantes, a Lunardelli de hoje em nada lembra a de 1993. Todos os fins de semana, romeiros de diversas partes do Paraná e de outros estados visitam o local para pagar promessas ou alcançar graças, nas quatro missas dominicais e nas novenas dos dias 22. Somados, os visitantes de um mês ultrapassam, e muito, o número de habitantes da cidade. “Tem fim de semana que vem quatro, cinco, três mil pessoas, varia muito. Quando o dia 22 cai num final de semana, aí é loucura. Costumamos receber pessoas de todo o Paraná, de Santa Catarina e São Paulo. Vem gente de Cascavel, Curitiba, Londrina”, diz a religiosa.
Hoje, além de uma feira de artesanato, promovida todos os domingos na praça da igreja, lanchonetes, restaurantes e lojinhas sobrevivem do turismo religioso. “A rota deve ajudar a criar infraestrutura, porque ainda não temos pousada, hotel. Mas tem loteamentos estourando de todos os lados, com quase tudo vendido. Tem muita coisa sendo construída”, conta a irmã Petronilda, que viu o avanço da cidade nos últimos 14 anos.
Bruna Komarchesqui
Iniciativa deve gerar mais empregos
Em Califórnia, cidade que mais fabrica artigos sacros no Brasil, a criação de uma rota de turismo religioso na região representa também possibilidades de crescimento econômico para o município de 8 mil habitantes. A prefeita Ana Lúcia Mazeto Gomes (PSDB) argumenta que a cidade deverá aproveitar a iniciativa para ampliar postos formais de trabalho.
A expectativa é que, a partir do roteiro, as empresas se organizem no setor e que novas funções para a acolhida dos visitantes também sejam criadas. “Esperamos que as empresas possam alavancar sua produção. Hoje, já temos uma geração de empregos grande na área, apesar de informal. Os produtos, como terços e suportes em madeira para bíblias e imagens, são enviados para cidades do Brasil todo, principalmente Aparecida, em São Paulo”, pontua ela.
Segundo Ana Lúcia, o envolvimento das prefeituras no estabelecimento de um roteiro turístico é importante para ajudar a viabilizar a ideia. Por isso, um parque dedicado a São Francisco deve ser construído na cidade no ano que vem, a fim de incluir Califórnia no percurso. Orçada em R$ 400 mil, a obra deve ocupar uma área verde na saída para o bairro Figueirinha. Parte dos investimentos, R$ 250 mil, foi obtida através de emenda parlamentar federal. “O projeto já foi idealizado pela Engenharia da Prefeitura. Nossa comunidade é muito participativa nas atividades religiosas. Existe uma relação forte com temas de fé no Vale do Ivaí”, diz.
Antoniele de Cássia Luciano
O diretor-presidente da Fundação Cultural e Turismo de Apucarana, Ednei Roberto Rosina Mansano, explica que a rota será formada por dois percursos, um menor e outro mais longo, com uma semana de duração. “Somente aqui no município, a ligação com o sagrado é forte. Temos o Parque da Redenção, a Catedral de Nossa Senhora de Lourdes, o Parque Santo Expedito, o Santuário São José. Somente depois do congresso, já recebemos visitantes do Uruguai, Paraguai, Chile e México.”
Mansano ressalta, no entanto, que a ideia é fomentar visitas em todo o cinturão religioso do Vale do Ivaí, que inclui cidades importantes como Astorga, Ivaiporã, Fênix e Lunardelli. O primeiro passo para a concretização da rota foi um inventário turístico da região, feito há vários anos, em parceria com a Faculdade Estadual de Ciências Econômicas de Apucarana (Fecea). “Nosso objetivo não é centrar somente em Apucarana, nem apenas no catolicismo, porque a região tem muitos templos budistas e o maior templo da Congregação Cristã no Brasil. Quando falamos em rota da fé, tiramos o peso de apenas uma religião.”
A rota, explica Mansano, foi desenvolvida pensando na existência de dois tipos de visitantes religiosos: os romeiros, que vão atrás de pagar promessas e têm permanência curta, e os turistas, que buscam conhecer a cidade e os atrativos locais. “Existe uma ligação muito forte do sagrado com a natureza. Não queremos que o turista se hospede em Apucarana e vá até Lunardelli, apenas. Nossa intenção é proporcionar turismo com qualidade de vida, sem pressa, sem o agito da cidade.”
Até o momento, mais de 30 placas já foram instaladas em Apucarana, com indicações dos pontos turísticos. A ideia daqui para frente é ampliar os roteiros já existentes, como o Fé na Estrada, uma caminhada de 118 quilômetros de Apucarana a Lunardelli, em parceria com a Emater. As caminhadas são realizadas mensalmente, com duas edições internacionais já conhecidas dos turistas: uma em 14 de julho e outra em 23 de novembro.
Santuário, ponto de testemunhos em Apucarana
O Santuário de São José, em Apucarana, já faz parte do caminho dos devotos do patrono dos trabalhadores na região e deve também integrar o roteiro de turismo religioso no Vale do Ivaí. O ápice da concentração dos peregrinos é em 1º de Maio, quando fieis de outras cidades do Brasil seguem a Apucarana para fazer orações e pedir bênçãos.
Mário Felipe Rodrigues, missionário leigo pregador no Santuário, relata que é comum os visitantes testemunharem graças, como o fim do desemprego. “Sentimos que a devoção por São José é muito grande. As pessoas vêm de longe com suas carteiras de trabalho pedir ajuda.” A movimentação dos cerca de 2 mil romeiros começa às 5 horas e eles seguem juntos em procissão.
Todo dia 19 de cada mês também há uma novena para o santo, com 700 fiéis em três horários. O santuário conta ainda com Adorações ao Santíssimo todas as quintas-feiras, e uma missa de cura e libertação em intervalos de dois meses. As celebrações atraem 1,2 mil pessoas a cada edição, num local projetado para 900 pessoas.

Integração
Criado em 2000, o San­­tuário de São José tem suas atividades desenvolvidas de forma integrada em Apucarana com a paróquia de mesmo nome, com um colégio privado e o Centro de Espiritualidades Josefino, único centro de estudos sobre o santo em língua portuguesa na América Latina. Segundo Rodrigues, toda a formação Josefina do país sai do município. Um museu com mais de 600 imagens de São José também compõe os domínios do santuário.

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