Poucos dias após a morte de dom Moacyr, o então bispo auxiliar dom Rafael Biernaski foi escolhido como administrador arquidiocesano por um conselho de sacerdotes. Acostumado a dividir os compromissos episcopais com o falecido arcebispo, ele diz que essencial ao sucessor será ter boa condição física. “Há uma demanda intensa por celebrações, reuniões, artigos e entrevistas. É preciso muita disposição para estar presente em tantos compromissos que exigem deslocamentos constantes.”
Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Católicos de Curitiba se preparam para escolher o sucessor de dom Moacyr
ESCOLHA
Confira passo a passo como será feita a escolha do próximo arcebispo de Curitiba:
• Consultas
A primeira e mais demorada etapa é levada adiante pelo núncio apostólico, o representante oficial do papa no país, que no caso do Brasil é o italiano Dom Giovanni d’Aniello. Ele é encarregado de fazer dezenas de consultas a autoridades eclesiásticas e fiéis leigos, solicitando informações sobre a situação da arquidiocese, sobre as características necessárias ao próximo bispo e coletando nomes de potenciais sucessores.
• Perguntas
As consultas são feitas por meio de cartas enviadas de modo sigiloso a cada uma das pessoas ouvidas. Algumas perguntas dizem respeito à quantidade de paróquias, sacerdotes, seminaristas e fiéis. Também são coletadas informações sobre a situação econômica da diocese, bem como a realidade cultural e social na qual ela está inserida. Também se questiona sobre as expectativas do povo que precisam ser atendidas e, por fim, pede-se indicações de nomes para a sucessão. Para a função de arcebispo, em geral são escolhidos bispos com algum tempo de experiência em outra diocese menor.
• Quem é ouvido
No caso de Curitiba, serão ouvidos, em primeiro lugar, os bispos auxiliares e alguns padres. O núncio também pode ouvir leigos engajados em serviços pastorais ou recomendados por padres e bispos. Depois, deve consultar todos os bispos do chamado Regional Sul II, umas das divisões geográficas da Igreja no Brasil que abrange todo o Paraná. Por tratar-se de uma arquidiocese, também devem receber a carta do núncio vários arcebispos do Brasil, incluindo todos os cardeais, bem como a presidência da CNBB.
• A “terna”
Após concluída a etapa de consultas, o núncio elabora uma lista com três dos nomes citados, e ordena suas sugestões, explicando porque sugere como primeira opção o candidato “A”, como segunda opção o “B” e como terceira o “C”. Sobre esses três candidatos, o núncio fará um extenso relatório investigativo, no qual constam informações sobre sua saúde, sua vida espiritual, sua formação acadêmica, sua capacidade administrativa, entre outros dados.
• Em Roma
Concluído o processo, a papelada é enviada ao Vaticano, onde a Congregação para os Bispos deve verificar a regularidade da documentação e preparar uma “plenária”, reunião de cardeais que estudarão o levantamento antes de entregá-lo ao papa, que escolhe um dos nomes apresentados. O papa pode também optar por um quarto nome de sua confiança.
Mas se saúde seria uma qualidade desejável em qualquer diocese, o caso de Curitiba deve impor desafios peculiares. “É preciso ter uma boa capacidade intelectual, porque esta diocese é exigente quando se trata de cultura. A sociedade de Curitiba precisa contar com a voz da Igreja em muitos debates que nela ocorrem”, diz dom Rafael. Um dos ambientes em que essa capacidade deve ser testada é o universitário, já que a escolha para o arcebispado concede automaticamente ao indicado o título de grão-chanceler da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Dom Rafael completa a lista citando como pré-requisitos do próximo arcebispo uma segura formação teológica e doutrinal, uma personalidade serena e disposição para ações pastorais mais dinâmicas.
Candidatos
Histórico aponta para sucessor “caseiro”
O nome do próprio dom Rafael tende a ser um dos mais citados na etapa de consultas que antecede à decisão que será tomada pelo papa Francisco. Nascido e ordenado em Curitiba, ele fez mestrado e doutorado em Roma, onde trabalhou por 16 anos como oficial da Congregação para os Bispos, justamente o órgão da Santa Sé responsável pelos processos de sucessão episcopal. “Por ter sido escolhido como administrador arquidiocesano, por sua postura pastoral e pela aceitação geral que possui na Igreja de Curitiba, o nome de dom Rafael seria uma opção natural”, diz o teólogo Robert Rautmann. Ele cita também dom Celso Marchiori, atual bispo de Apucarana, como forte candidato. Antes da ordenação episcopal, em agosto de 2009, dom Celso foi reitor de dois seminários em Curitiba, além de pároco na Paróquia do Santíssimo Sacramento, no Água Verde.
Bispos auxiliares
A história das indicações de bispos para Curitiba mostra ainda que bispos auxiliares que passaram pela arquidiocese também seriam nomes a serem considerados. Assim ocorreu com dom Moacyr, que atuou como bispo auxiliar do agora arcebispo emérito dom Pedro Fedalto, de 1988 a 2002, para depois sucedê-lo, em 2004. O próprio dom Pedro foi bispo auxiliar de dom Manuel da Silveira d’Elboux, de 1966 a 1970. Após a morte de dom Manuel, dom Pedro foi escolhido como administrador arquidiocesano e posteriormente indicado como arcebispo de Curitiba, em 1971.
Além de dom Rafael, Curitiba tem outro bispo auxiliar. Dom José Mario Angonese, foi nomeado para o cargo ano passado. Há ainda dom Dirceu Vegini, atual bispo de Foz do Iguaçu, e dom João Carlos Seneme, bispo de Toledo. Ambos serviram como auxiliares na arquidiocese de Curitiba na última década.
A tendência, no entanto, não exclui a possibilidade de Francisco optar por alguém alheio à realidade curitibana. O ex-arcebispo de Maringá, por exemplo, dom Murilo Krüger, foi transferido para arquidiocese de Florianópolis, em 2002, e, em 2011, assumiu a arquidiocese de Salvador, onde jamais havia atuado como sacerdote ou bispo.
Brasil teve bispos que foram mais do que líderes religiosos
A história do país mostra que alguns bispos católicos acabaram se tornando influentes em assuntos que foram muito além da religião. Relembre algumas personalidades eclesiais que ganharam destaque nos debates políticos e sociais do Brasil.
• dom Eugênio de Araújo Sales – Cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, de 1971 a 2001. Um dos criadores da Campanha da Fraternidade, ele foi um dos principais opositores à aproximação de comunidades católicas da esquerda política, nas décadas de 70 e 80. Por outro lado, foi um dos responsáveis pela articulação de apoio a refugiados políticos dos regimes militares latino-americanos entre 1976 e 1982, numa ação conjunta tomada pela Cáritas e pelas Nações Unidas. Amigo próximo do papa João Paulo II, chegou a ocupar 11 cargos em diferentes congregações e comissões da Santa Sé. Faleceu em 2012.
• dom Paulo Evaristo Arns – Cardeal arcebispo de São Paulo, de 1970 a 1998. Foi uma das vozes mais frequentes nos protestos contra as torturas ocorridas durante a ditadura militar. Dedicado principalmente às ações voltadas à periferia de São Paulo, incentivou o desenvolvimento da Pastoral Operária e foi um dos fundadores da Pastoral da Criança, junto de sua irmã, Zilda Arns. A atuação do cardeal lhe rendeu prêmios internacionais de reconhecimento pela defesa dos direitos humanos. Tem 92 anos e é arcebispo emérito de São Paulo.
• dom Helder Câmara – Arcebispo de Olinda e Recife, de 1964 a 1985. Um dos fundadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, Câmara ganhou notoriedade pela oposição feita ao regime militar brasileiro e pela defesa dos direitos humanos. Foi indicado quatro vezes para o Prêmio Nobel da Paz. Faleceu em 1999.
• dom Luiz Gonzaga Bergonzini – Bispo de Guarulhos, de 1991 a 2011. Foi eleito pela revista Época um dos 100 brasileiros mais influentes de 2010, graças à sua atuação contra o aborto. Nas eleições de 2010, chegou a imprimir panfletos e escrever artigos orientando os católicos a não votarem em Dilma Roussef, por esta ser favorável à legalização do aborto. Faleceu em 2012.
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