Até chegar a esse ponto, o processo não foi simples e nem significou o fim dos desafios. O colégio foi um dos primeiros a aderir à sugestão da Secretaria de Estado da Educação (Seed) de promover o Plano Personalizado de Atendimento (PPA), que tem a intenção de corrigir a distorção entre idade e série nas escolas estaduais. Apesar de ter sido lançado em maio, o programa já havia sido anunciado aos colégios na metade de 2011. Dezoito instituições saíram na frente e iniciaram a reclassificação de seus alunos de forma autônoma.
Mais confiante e aplicado
Ele era mais alto que os outros colegas de classe e a timidez não ajudava a enfrentar as piadinhas sobre as dificuldades que tinha em passar de ano. Dentro do Colégio Estadual Luiz Carlos, Marco (foto), 14 anos, é considerado um bom exemplo de estudante que passa pela reclassificação. Depois de ter estudado durante um mês no contraturno, Marco fez uma prova, foi aprovado e passou do 6º para o 8º ano. Ele acompanhou a turma e neste ano está no 9º ano. “Mudou para melhor, antes era muito difícil. Eu era mais velho e tiravam sarro por eu não passar de ano”, conta o garoto. O maior apoiador de Marco foi seu pai, o autônomo Valdemir Rodrigues Marquini (foto). Verificar se o filho está cumprindo as obrigações escolares, cobrar boas notas e ir frequentemente até o colégio para ver como Marco está se saindo são práticas comuns de Valdemir. “Acho muito importante essa oportunidade que ele teve. Estou orgulhoso, pois ele está aproveitando a chance, se esforçando, estudando mais se tira nota mais alta. Percebo que ele está mais confiante”, conta. Apesar de ainda não ter definido que carreira seguir, Marco conta que vai prestar o vestibular. A preferência é pela área da computação. (AC)
Continuidade
É preciso dar condição de trabalho a professor e pensar no estudante
Embora o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) possibilite o avanço de alunos que estejam atrasados com os estudos, é com o Plano Personalizado de Atendimento (PPA) que o governo estadual pretende organizar esse processo. A superintendente da Educação, Meroujy Giacomassi Cavet, conta que foi identificado um grande número de alunos fora de sua faixa etária escolar no Paraná.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), no Paraná, 14,8% dos alunos do ensino fundamental e 23,9% do ensino médio estavam fora de suas séries em 2010. O total chegava a 26,5% entre alunos do ensino médio da rede estadual.
“Este é um plano personalizado de atendimento que leva em conta a situação de cada aluno, se ele reprovou por falta ou por motivo de doença, por exemplo. Não é um programa massificado e nem foi feito para empurrar o aluno porque queremos o sucesso dele. A nossa proposta é de até o fim desta gestão conseguir atender ao menos 100 mil alunos pelo PPA”, afirma Meroujy.
Mais que estatísticas
Para a pedagoga e mestre em Educação Ermelina Generosa Thomacheski, professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, programas que visam corrigir a distorção entre série e idade são muito positivos, pois resgatam a autoestima do aluno e podem oferecer atendimento personalizado, que leva em conta o motivo do aluno estar atrasado, lutando contra a desistência dele em relação à escola.
“É importante que a política educacional não pense só em resgatar números ou ter estatística. Deve oferecer apoio individualizado ao aluno e condições de trabalho para os professores. O docente não pode ficar sobrecarregado ou ter turmas muito numerosas, por exemplo”, diz. (AC)
Uma série de critérios deve ser observada antes de um aluno “saltar” etapas. Para ser aceito no processo, o jovem deve passar em um teste compatível com a série na qual deveria estar. Além disso, ele deve estar comprometido com os estudos, já que deverá se esforçar para tentar compensar o conteúdo que havia deixado de receber de forma regular. A participação da família, apoiando os estudos em casa e assinando um termo de compromisso, também é essencial no processo.
Qualquer escola estadual pode aderir ao PPA. A instituição deve identificar quantos alunos estão atrasados nos estudos, elaborar material didático e um cronograma de aulas preparatórias fora do horário normal das aulas, além de desenvolver e aplicar as provas. O estudante deve atestar que domina o conteúdo que condiz com sua idade. “Nós sugerimos o encaminhamento, damos a diretriz, mas a escola determina como se dá o encaminhamento real”, afirma a diretora de Políticas e Programas Educacionais da Seed, Fernanda Scaciota.
Demanda
Entre os 151 alunos reclassificados no Colégio Luiz Carlos, aqueles que não foram colocados em turmas próprias acabaram inseridos em classes já existentes, conforme a idade de cada um. E nem todos os interessados – a demanda total foi de 240 jovens – tiveram a chance de “pular” etapas. “Fizemos um conselho de classe e reunimos todos os professores da escola. Todos aceitaram participar do programa e apontaram quais seriam os alunos candidatos à reclassificação, os que teriam condições de acompanhar a nova série”, conta a diretora Jane Warcherski.
A organização do conteúdo e do horário das aulas foi a parte mais desafiadora. A solução encontrada pelo colégio foi contar com o esforço extra dos professores. Por iniciativa própria, eles sacrificaram algumas horas-atividades para promover os aulões especiais, uma preparação para os alunos candidatos à reclassificação.
Apoio deve ser contínuo
Entre os principais fatores que levam à evasão escolar estão a dificuldade em acompanhar o conteúdo das séries e a repetência. O aluno que é retido uma, duas ou três vezes tem dificuldades para se integrar aos colegas – mais novos, mais baixos, menos maduros e com outros interesses. Além disso, é comum o jovem ter a sua autoestima afetada pelo fracasso e a sensação de ser incapaz de aprender.
Entretanto, quando participa de uma reclassificação de série, o estranhamento também é comum. “Os alunos chegam à nova sala se sentindo peixes fora d’água. No início, eles mesmos diziam que eram da ‘turma dos burros’. Percebemos que era preciso atendê-los de outra forma, mesmo porque eles também eram imaturos, pois tinham ficado anos com alunos mais novos”, conta a pedagoga Ticiana Matsushita, do Colégio Estadual Luiz Carlos, que já adotou o sistema de reclassificação.
O acompanhamento e o apoio contínuos são importantes para que o aluno supere o período de adaptação e passe a se dedicar como os outros colegas da mesma idade. “Se um aluno passa do 6.º para o 9.º ano, nós não queremos que ele pare aí. Queremos que ele tenha condições de passar pelo ensino médio. Para isso deve ter apoio da escola, dos professores, dos pais, para que ele se fortaleça cada vez mais”, afirma a superintendente da Educação, Meroujy Giacomassi Cavet.
Até agora, o resultado do esforço conjunto entre escola, professores e pais tem valido a pena no Colégio Luiz Carlos. “A alegria desses jovens quando souberam que tinham passado na prova foi algo inesquecível. Havia um aluno que nunca falava nada, nem sorria. Ele havia repetido três vezes de ano e andava sempre cabisbaixo. Quando descobriu que ia ser reclassificado eu até descobri que ele usava aparelho. O sorriso ia de orelha a orelha”, relata a diretora Jane Warcheski.
Preocupação
Uma das preocupações que podem vir à tona em um programa de reclassificação tem relação com a real capacidade do estudante de absorver, em pouco tempo, um conteúdo que os colegas tiveram em dois ou mais anos de estudo regular. No entanto, a mestre em Educação Ermelina Generosa Thomacheski lembra que, mesmo quando o aluno está retido em alguma série, ele continua em crescimento e aprendendo. “Ele não avançou na série, mas muitas vezes consegue aprender mais rapidamente esse conteúdo que já viu. A gente aprende não só na escola, mas na vida e em outras situações. Estamos acostumados com a organização de um currículo linear, mas, atualmente, sabemos que o conhecimento está disponível em várias fontes.”
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