terça-feira, maio 29, 2012

Ascensão social da nova classe C atrai assaltantes


Além de tornar realidade sonhos de consumo antes inimagináveis, o crescimento econômico também transformou casas da nova classe C de Curitiba em coqueluche de assaltantes. Dados cruzados da Polícia Civil e da prefeitura indicam que nos dez bairros que mais sofreram com roubos a residência, os chefes de família aumentaram seus rendimentos nos últimos anos, apesar de ainda terem renda abaixo da média curitibana.
Entre 1º de janeiro e 19 de abril deste ano, essas regiões concentraram 42% do total de casos dessa natureza registrados na capital paranaense. No período analisado, segundo números da Delegacia de Furtos e Roubos, foram reclamados 565 roubos a casas. Destes, 236 ocorreram no Ube­raba, Cajuru, Boqueirão, Sítio Cer­cado, CIC, Novo Mundo, Xaxim, Pinheirinho, Fanny e Bairro Alto.
De acordo com o Guia do Investidor, a renda média do chefe da família nesses bairros cresceu 10% entre 2007 e 2010 – passando de R$ 1.542 para R$ 1.715. Apesar desse aumento, o valor ainda é 41% menor do que a renda média do líder familiar curitibano, que chegou a R$ 2.889 em 2010, última projeção do relatório divulgado anualmente pela prefeitura de Curitiba.
Especialistas apontam que esse crescimento econômico, mesmo que pequeno, pode estar diretamente ligado ao aumento dos crimes contra o patrimônio na periferia curitibana. “É possível que bairros mais vulneráveis, mas cujos moradores ganharam renda, tenham aumento nos roubos”, diz o sociólogo Pedro Bodê, coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Opinião semelhante tem o também sociólogo Lindomar Bonetti. “A marginalidade não se origina necessariamente em bairros pobres. Mas agora o conflito é detonado lá [na periferia] porque o giro de capital chama os crimes”, diz o especialista, que leciona na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).
Quem trabalha com segurança diz que essa vulnerabilidade pode ser explicada pela ainda ausente prática da terceirização da segurança nos bairros menos nobres da capital. “A concentração dos crimes mudou de tempos para cá porque os meliantes notaram que famílias com renda maior investiram em segurança”, diz Albary Almeida, gerente de operação de uma empresa de segurança privada em Curitiba.
Quem tem o trabalho de investigar esses crimes também corrobora com a tese do setor de segurança privada. “Os bairros ricos começam a ter vigilância privada e por isso eles [criminosos] migram. Mas a maioria dos crimes está na região sul e o principal problema ali são as quadrilhas”, analisa Guilherme Rangel, delegado da Delegacia de Furtos e Roubos.
O Sindicato das Empresas de Segurança Privada do Estado do Paraná (Sindesp-PR) não quis se manifestar na reportagem. Empresas do setor informam, porém, que o custo médio inicial para instalação de um kit segurança, com cerca elétrica e alarme, chega a R$ 1,5 mil – 87% da renda média do curitibano nos bairros mais visados pelos assaltantes de casas em 2012.
Aumento
Roubos crescem 17% nos bairros mais visados
A quantidade de roubos a residências nos dez bairros mais visados de Curitiba em 2012 cresceu 17% na comparação com o primeiro quadrimestre do ano passado. Juntos, Uberaba, Cajuru, Boqueirão, Sítio Cercado, CIC, Novo Mundo, Xaxim, Pinheirinho, Fanny e Bairro Alto concentraram 236 roubos a casas entre 1.º de janeiro e 19 de abril deste ano ante 196 registros do primeiro quadrimestre de 2011. Como os dados do mês de abril do ano passado são completos, essa diferença deve ser mais alta.
Levando em consideração a cidade inteira, o crescimento até o momento foi de 3% no período analisado. Segundo dados do relatório “mancha criminal” produzido pela Polícia Civil, foram registrados 565 casos até 19 de abril de 2012 ante 550 nos primeiros quatro meses de 2011. Caso a quantidade média de casos por dia seja mantida, esse crescimento pode chegar a 14%.
Segundo a Polícia Civil, os dados levantados ajudam no trabalho de prevenção. “Com esses dados, devemos concentrar o efetivo nessas áreas para resolver o problema”, diz o delegado Guilherme Rangel, da Furtos e Roubos. “Temos de rodar na rua de forma preventiva e combater o local onde esses materiais [roubados] são levados para receptação”, diz o coronel Ademar Cunha Sobrinho, comandante do 1.º Comando Regional da PM. (RM)
Chamariz
Criminosos buscam joias e objetos eletrônicos
Vítimas de roubos residenciais ouvidos pela Gazeta do Povo relatam momentos de pânico. Ainda traumatizados, muitos preferem não ter o nome divulgado. Dizem não entender como a residência deles, antes inabalável, virou alvo de criminosos. Mas a explicação para os crimes pode estar nos novos objetos que compõem a sala de suas casas.
Na manhã de um sábado de fevereiro, três criminosos pararam um automóvel Pálio amarelo em frente a um imóvel da Rua Aristeu Martins, no bairro Uberaba, e os alvos deles estavam exatamente na sala: uma tevê LED de 46 polegadas e um vídeogame X-BOX recém-comprados com o dinheiro de uma rescisão contratual do dono da casa.
Armado, o trio desceu do veículo e apontou as duas armas na cabeça do filho de Eliane Salete Santos, 50 anos, e da mulher dele. “Eles deixaram hematomas na minha nora, pegaram a tevê e o vídeogame e depois saíram rindo”, conta a professora, que pede mais policiamento na região, mesmo após o bairro ter recebido a primeira Unidade Paraná Seguro (UPS) de Curitiba. “Eles só pensam no Uberaba de cima, mas o de baixo fica esquecido”.
Ameaças
Situação de violência semelhante viveu uma moradora da Rua Antônio Pastre, na Cidade Industrial, que teve a casa roubada às 7 horas de uma segunda-feira de janeiro. “O bandido tinha uma pistola 380 e usou uma vizinha para me convencer a abrir a porta. Como eu não tinha dinheiro, ele me ameaçava de morte. Foram 40 minutos que pareciam uma eternidade,” relata.
No Cajuru, segundo bairro com mais roubos a residência em Curitiba em 2012, uma senhora de 60 anos diz ter perdido R$ 12 mil com a ação de criminosos. “Levaram laptop, TV e joias”, diz a mulher, que também pediu para não ter o nome revelado por medo de represálias. (RM)
Fonte: Gazeta do Povo 29/05/2012



Nenhum comentário:

Postar um comentário