Condutores que fogem sem pagar a taxa podem ser acionados na Justiça pela concessionária. Já a multa de trânsito só pode ser aplicada se um policial flagrar a irregularidade
Dois carros se aproximam da cabine da praça de pedágio, um atrás do outro. O primeiro paga a taxa, espera a cancela subir e arranca. Colado no veículo da frente, o segundo aproveita a cancela aberta e passa sem pagar. A situação, conhecida como fuga ou evasão da praça de pedágio, está a cada ano mais comum no Paraná.
O número de notificações enviadas pelas concessionárias aos motoristas “furões” já era, até o mês passado, 385% superior ao total acumulado no ano passado. Em em 2011 foram enviados 127 avisos contra 617 entre janeiro e setembro deste ano, segundo a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias do Paraná (ABCR-PR). A medida passou a ser usada com mais frequência pelas concessionárias para tentar coibir a prática, principalmente nos casos em que há reincidência. As notificações não resultam em multas de trânsito, o que só é possível quando a ação é flagrada por policiais rodoviários, mas os motoristas podem ser acionados judicialmente.
Protesto
Em 2008, deputado Romanelli ignorou três praças de cobrança
Em janeiro de 2008, o secretário estadual do Trabalho, Emprego e Economia Solidária, Luiz Claudio Romanelli, então deputado estadual pelo PMDB, furou o pedágio de três praças no mesmo dia. Ele voltava de Cornélio Procópio para Curitiba. Na época, Romanelli argumentou que tomou a atitude como forma de protesto contra o valor cobrado pelas concessionárias.
O parlamentar conseguiu se livrar da multa aplicada pela Polícia Rodoviária Estadual. Ele entrou com um recurso junto ao Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná, que deferiu e arquivou o auto de infração. No recurso, argumentou que não poderia ter sido multado porque o policial rodoviário não o flagrou furando o pedágio. (WK)
617 avisos
de advertência foram enviados por correio pelas concessionárias de pedágio aos motoristas “furões” até setembro deste ano, contra 127 durante todo o ano passado. Junto com a notificação, o condutor recebe um boleto com os valores de pedágios não pagos. Se ainda assim se recusar a pagar, ele pode ser acionado judicialmente.
Flagrante
Se flagrada por um policial, a evasão é considerada infração grave segundo o artigo 209 do Código de Trânsito Brasileiro, sujeita a multa de até R$ 127 e perda de cinco pontos na Carteira Nacional de Habilitação.
Como funciona
A advertência é enviada anexa a um boleto com as taxas de pedágio não pagas. Quando a quitação não é feita, a concessionária promove a cobrança judicialmente. A assessora jurídica da concessionária Viapar, Vanessa Morzelle, cita como exemplo um caso em que um juiz deu parecer favorável à empresa e obrigou o infrator a quitar o boleto, além de estipular uma multa de R$ 500 caso o condenado voltasse a furar o pedágio.
As empresas flagram as placas dos veículos que passam pelas praças sem efetuar o pagamento por meio de câmeras de vigilância. Segundo o agente de operações da Viapar Luciano Mendes, a notificação é enviada quando a atitude do motorista passa a ser rotineira. “Procuramos não enviar ao usuário que evade uma vez ou outra, mas para aqueles costumeiros.”
O presidente da ABCR-PR, João Chiminazzo Neto, diz que as evasões não causam grandes prejuízos às concessionárias. A preocupação é outra. “O problema é que essas pessoas colocam em risco a própria vida e a de terceiros nessas passagens. São atitudes que podem acabar com famílias por causa de R$ 5.”
Ele conta que em abril deste ano uma pessoa morreu após uma fuga de pedágio. O caso aconteceu na praça de Jataizinho, na BR-369, depois que um veículo que furou a praça em alta velocidade bateu na lateral de um outro carro que fazia um retorno. Uma adolescente que estava no banco de trás do veículo atingido acabou arremessada para fora.
O agente de pedágio da Viapar Anderson Marcos Calderam passou por um susto em março deste ano. Ele apertava parafusos de uma das cancelas da via expressa da praça de Arapongas, na BR-369, quando um caminhão tentou fugir sem pagar a taxa e quase o atropelou. O veículo não tinha o dispositivo que abre automaticamente a cancela. Segundo a empresa, graças às imagens feitas pela câmera de segurança, o motorista foi julgado e penalizado por direção perigosa.
Rebeldia
Advogada gaúcha fica famosa na internet por nunca pagar a tarifa
Uma mensagem na internet, disseminada nas redes sociais e em e-mails há cerca de dois anos, deixou uma advogada do Rio Grande do Sul conhecida em todo o Brasil. Márcia dos Santos Silva dizia que decidiu não pagar mais pedágio. Baseada na Constituição Federal de 1988, ela passou a colocar em prática uma ideia apresentada no trabalho de conclusão do curso de Direito da Universidade Católica de Pelotas. Ela tomou como argumento para a não obrigatoriedade do pagamento o artigo 5º, inciso 15, que fala do direito da pessoa de ir e vir. “A Constituição tira a legitimidade do Código de Trânsito Brasileiro. Não me sinto devedora da concessionária.”
Márcia conta que geralmente fura o pedágio quando o veículo da frente paga a taxa e a cancela sobe. “Vou na carona de algum cidadão que doa o dinheiro para a concessionária”, ironiza. Apesar da repercussão da história em todo o país, ela afirma que não está satisfeita. “Não vi resultado prático. Nada parece mudar e as tarifas de pedágio continuam aumentando.”
Mesmo carregando o argumento na ponta da língua, Márcia conta que já passou por situações embaraçosas. Em uma delas, policiais queriam levá-la para a cadeia. Ela diz que já recebeu notificações e multas, mas sempre entra na Justiça e recorre.
Gisele Barioni, presidente da Comissão de Direito de Trânsito da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Subseção Paraná, diz que o argumento usado por Márcia não transforma o pedágio em uma taxa inconstitucional. “Isso só poderia ser discutido em um processo específico ou uma ação”, disse.
Direito
Via alternativa desvia veículos de pedágio em Campo Mourão
A advogada Gisele Baroni, da Comissão de Trânsito da OAB-PR, explica que a Constituição Federal garante aos motoristas o direito de escolher entre utilizar ou não uma estrada pedagiada. “É especificado que precisa existir uma via alternativa para a pessoa usar. Ela precisa ser adequada ao uso, ter o mínimo de estrutura, conforto e a mesma proximidade em relação à via com pedágio”, explica.
Na BR-369, existe um caminho que serve como desvio ao pedágio na divisa entre as cidades de Campo Mourão e Mamborê, na Região Centro-Oeste do Paraná. A estrada, que não é asfaltada, fica a aproximadamente 500 metros da praça, nas duas direções da rodovia, e aumenta em cerca de sete quilômetros o trajeto.
Por causa do aumento de fluxo no desvio, que não é asfaltado, a Câmara Municipal de Mamborê aprovou uma lei que reduz a taxa do pedágio aos veículos com placas do município. O valor cai pela metade. O motorista de um carro, por exemplo, paga R$ 4,35 contra os R$ 8,70 cobrados normalmente. Para obter o desconto, o motorista precisa fazer um pré-cadastro na prefeitura e instalar um sensor, válido apenas na praça de Campo Mourão.
Gisele cita a Estrada da Graciosa, ligação entre Curitiba e as praias paranaenses, como exemplo de desvio baseado na lei. “Não se gasta muito mais com a gasolina. A diferença é o limite de velocidade menor, que chega a 60 quilômetros por hora em alguns trechos. Isso atrasa a viagem, mas não a exclui das características citadas na Constituição.
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Fonte: Gazeta do Povo 09/10/2012
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