O jornal Gazeta do Povo veiculo, em sua edição deste sábado (15), um
importante resgate cultural sobre a revolução de 1924, e os reflexos na cidade
de Catanduvas e em todo o Oeste do Paraná.
"Passados quase 90 anos do fim do
conflito, Catanduvas, no Oeste do Paraná, ainda convive com as trincheiras da
guerrilha e estradas usadas na época", relata o jornalistaDiego Antonelli.
"Por cinco meses, a região
tornou-se cenário de lutas políticas e militares. Considerada como a “revolução
esquecida”, a Revolução de 1924 começou dois anos antes, quando um grupo de
militares do Rio de Janeiro se rebelou no Forte de Copacabana", destaca o
jornal.
Leia a seguir a íntegra da reportagem:
Um Oeste entre
trincheiras e balas
Há
quase 90 anos, Catanduvas tornava-se palco estratégico do conflito entre
revolucionários e legalistas, que deixou cerca de mil mortos
Uma terra marcada até hoje pelas balas
que ecoaram durante a Revolução de 1924. Passados quase 90 anos do fim do
conflito, Catanduvas, no Oeste do Paraná, ainda convive com as trincheiras da
guerrilha e estradas usadas na época. Dois cemitérios são preservados em
memória de uma batalha que terminou com quase mil mortos. Há relatos de
que por um tempo as serrarias da cidade perdiam suas serras elétricas,
pois parte das árvores tinham balas e estilhaços que arrebentavam os
equipamentos.
Por cinco meses, a região tornou-se
cenário de lutas políticas e militares. Considerada como a “revolução
esquecida”, a Revolução de 1924 começou dois anos antes, quando um grupo de
militares do Rio de Janeiro se rebelou no Forte de Copacabana.
O Brasil vivia sob o anacronismo da
República Velha. O grupo de militares, que deu início ao movimento tenentista,
lutava pela moralização política e fim da corrupção eleitoral. Os tenentes
estavam indignados com as precariedades das corporações e com a crise que
penalizava a classe média, de onde eles eram originados. A ordem era mudar
essa lógica e tirar Arthur Bernardes da Presidência do Brasil.
Em 1924, o tenentismo retornou com
força em São Paulo, quando Miguel Costa liderou as movimentações –
3,5 mil revolucionários chegaram a assumir o poder da capital paulista por três
semanas. Acuados pelo cerco de 14 mil soldados legalistas, saíram de São Paulo,
foram escorraçados em Mato Grosso e seguiram para o Paraná.
“Eles chegaram primeiro em Guaíra e
depois seguiram para Catanduvas, um ponto estratégico”,
relata o historiador Aimoré Índio Arantes. Estratégico porque neste local havia
um posto de telégrafo, onde poderiam se comunicar com o resto do Brasil,
inclusive com as tropas de Luís Carlos Prestes. Ali seria o local onde a coluna
de Miguel Costa se encontraria com a de Prestes, que vinha de Santo Ângelo
(RS).
Os revoltos resistiram aos ataques
legalistas na espera do reforço de Prestes. “Mas os gaúchos vinham a cavalo.
Quando adentraram em território catarinense e paranaense se depararam com
florestas densas e um grupo de soldados legalistas, o que atrasou o encontro”,
afirma Arantes.
Em março de 1925, os tenentes sem
munição, passando necessidades e com sinais dedoenças de pele e
respiratórias, renderam-se às tropas do então general Cândido Rondon. Eram
quase 1,5 mil revoltosos contra 5 mil soldados legalistas. No final, 407
revolucionários foram presos. Muitos fugiram, como foi o caso de outro líder do
movimento, João Cabanas, que se exiliou no Paraguai.
Prestes só chegou ao Paraná em abril de
1925, quando Catanduvas já havia sucumbido. “Um pequeno grupo dos tenentes
ainda conseguiu se encontrar com a coluna de Prestes em Foz do Iguaçu”, relata
Arantes. Assim, somaram cerca de 1,2 mil homens e deram início à coluna Prestes
que por dois anos percorreu 25 mil km no Brasil.
Coluna Prestes se
consolidou no Paraná
Apesar do atraso da Coluna Prestes em
chegar ao Paraná, alguns integrantes do movimento tenentista paulista
conseguiram se aliar aos gaúchos e começaram a percorrer o Brasil. O
historiador Renato Carneiro explica que a coluna tinha por finalidade levar ao
interior a luta contra o governo e suas ramificações de poder, passando por um
total de 13 estados no país de 1925 a 1927. Ele relata ainda que no Paraná a
Coluna percorreu cidades da fronteira Oeste.
Foi inclusive nessa região que a Coluna
Prestes, propriamente dita, começou – mais precisamente no atual município de
Santa Helena. “Foi nessa localidade que as tropas que estavam em Foz do Iguaçu,
formadas por gaúchos e paulistas, realmente unificaram as forças”, explica o
historiador Aimoré Índio Arantes.
Os líderes rebeldes decidiram realizar
a integração dos dois grupos em um único exército, cujo comando ficou dividido
entre Miguel Costa e Prestes. A Coluna Prestes – ou Coluna Miguel Costa-
Prestes, para alguns – enfrentou frequentes combates com as forças legalistas.
Do Paraná, eles seguiram para o atual estado do Mato Grosso do Sul.
Em 1927 já desgastados e sem
perspectivas de vitória contra o governo federal, os líderes optaram por
encerrar aquela fase do movimento. Muitos dirigiram-se à Bolívia, enquanto
Miguel Costa fixou-se na Argentina.
As ações da Revolução de 1924 e,
consequentemente, da Coluna Prestes serviram como estimulantes para a Revolução
de 1930, que culminou com o fim da chamada República Velha e deu início ao
governo de Getúlio Vargas.
Exploração
Revolução também
mudou a ocupação da região
O Oeste do Paraná no início do século
20 era tomado por empresas anglo-argentinas que exploravam a erva-mate e,
segundo o historiador Adelar Paganini, não pagavam impostos ao Brasil. Muitos
trabalhadores brasileiros eram, inclusive, submetidos a condições de trabalho semelhantes
às de escravidão. Esse tipo de exploração era realizado pelos chamados obrages.
O interesse fundamental de um “obrahero” não era a colonização nem povoamento e
sim a extração da erva mate, nativa da região, bem como da madeira da mata
nativa.
Paganini salienta que com a chegada dos
revoltosos de 1924 e o fim da revolução, o governo federal passou a dar atenção
para região e iniciou a colonização com colonos do Sul do país. “E as empresas
estrangeiras foram despojadas das terras que sempre pertenceram à União”,
afirma o historiador, que trabalha no Memorial da Revolução de 1924, em
Catanduvas.
Com isso, trabalhadores e empresas
brasileiras foram assumindo o controle dos negócios, principalmente com a
chegada de colonos de Santa Catarina e também do Rio Grande do Sul, que
contribuíram para povoar e contribuir para a colonização do território.
Já com Getúlio Vargas no poder, começou
a chamada Marcha para o Oeste, que buscava colonizar regiões praticamente
desocupadas, próximas de fronteiras, como o Oeste e Sudoeste do Paraná.
Memorial
Em Catanduvas, desde 2012, há o
Memorial da Revolução de 1924. A ideia, segundo o historiador e um dos
curadores do espaço, Renato Carneiro, é dotar a cidade de um equipamentos
cultural multiuso que possa oferecer a oportunidade de conhecer a realidade
histórica da região, palco de uma revolução sangrenta e atos de heroísmo.
A prefeitura do município é responsável
pela administração do espaço cultural, que foi construído pelo governo do
Estado em 2010. Carneiro explica, porém, que o memorial ficou fechado até 2012,
“pois só havia sido edificado o prédio, sem a montagem museológica que se
previa”.
Foto: Reprodução
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