O presidente da Assembleia Legislativa do Paraná tem direito a receber, desde 1992, uma gratificação pelo exercício do cargo no mesmo valor da remuneração paga aos deputados. Na prática, isso significa que há 19 anos quem ocupa o cargo de presidente do Legislativo paranaense recebe o salário em dobro. Atualmente, a remuneração de um deputado estadual é de R$ 20 mil. Portanto, o atual presidente da Assembleia, Valdir Rossoni (PSDB), recebe mensalmente R$ 40 mil. O valor ultrapassa em quase 50% o teto máximo permitido para a remuneração no funcionalismo público, que é de R$ 26,7 mil.
O decreto legislativo que garante esse salário dobrado foi assinado pelo ex-presidente da Assembleia Aníbal Khury em 23 dezembro de 1992. O texto, no entanto, não dá maiores detalhes sobre a finalidade da gratificação. Apenas menciona que ela equivale ao salário de um deputado.
O outro lado
Deputado diz que não abre mão da verba
O deputado Valdir Rossoni (PSDB) confirmou que recebe a gratificação de representação desde que assumiu a presidência da Assembleia e deixou claro que não pretende abrir mão do benefício. "Além da atuação como deputado, tenho de dirigir a Casa, que é uma responsabilidade sem tamanho. Não vejo nenhum problema em receber essa verba", afirmou. "Não é salário; é uma verba para representar a Assembleia em vários lugares, como chefe de um poder."
Questionado sobre a revogação do decreto que estendeu o benefício a outros dois deputados, Rossoni disse que a extensão da gratificação ao primeiro e ao segundo-secretários da Casa ainda está sendo estudada pela Procuradoria da Assembleia. Segundo ele, por um deslize, foi publicada de forma equivocada no Diário Oficial. "Não acho justo o presidente receber, enquanto o primeiro-secretário, que trabalha tanto quanto eu, não receber."
Já sobre a extrapolação do teto constitucional, o entendimento da procuradoria é de que o benefício é, na verdade, uma gratificação, que não faz parte do salário do presidente. Portanto, legalmente, não haveria inconstitucionalidade no pagamento da verba.
Os outros três ex-presidentes da Assembleia que receberam o benefício e ainda estão vivos – Orlando Pessuti, Nelson Justus e Hermas Brandão – não retornaram aos pedidos de entrevista deixados nas secretárias eletrônicas dos seus celulares.(ELG e SM)
Pagamento é irregular, afirmam especialistas
A remuneração total do presidente da Assembleia Legislativa do Paraná não pode ultrapassar o teto constitucional de R$ 26,7 mil. A opinião é unânime entre especialistas consultados pela Gazeta do Povo. Segundo eles, a Emenda Constitucional n.º 19, de junho de 1998, é clara nesse sentido.
O primeiro beneficiário da gratificação foi o então deputado Orlando Pessuti, que comandou a Casa de 1993 a 1994. Na sequência, Aníbal recebeu o benefício durante cinco anos, entre 1995 e 1999; Nelson Justus de 1999 a 2000 e de 2007 a 2010; Hermas Brandão entre 2001 e 2006; e, por fim, Rossoni, que assumiu o cargo em fevereiro. Até hoje, portanto, cinco deputados receberam a gratificação no cargo de presidente.
Desde 1998, com a Emenda Constitucional n.º 19, que fixou o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) como remuneração máxima do funcionalismo público, a gratificação paga na Assembleia excederia o teto. Apenas a gestão de Pessuti não foi abrangida pela emenda.
Pagamento secreto
A revelação da gratificação veio à tona porque a Mesa Executiva da Assembleia publicou em Diário Oficial, no último dia 28 de setembro, o Ato 1.191/2011 estendendo o benefício ao primeiro e ao segundo-secretário da Casa – Plauto Miró (DEM) e Reni Pereira (PSB), respectivamente. Ontem, porém, a própria Mesa revogou o ato sob a justificativa de que a publicação em diário foi "equivocada".
No entanto, até a publicação do ato, que cita no texto o decreto de 1992, o pagamento da gratificação era desconhecida da sociedade até de deputados – em mais um exemplo das décadas de falta de transparência que marcaram a Casa. "Estou na Assembleia há vários anos e nunca ouvi falar dessa gratificação. A Mesa precisa esclarecer isso aos deputados", disse um parlamentar. "Sabia que o presidente recebia uma gratificação, mas achava que era apenas uma ajuda de custo, algo como um terço a mais de salário. Não essa barbaridade de um outro salário integral", afirmou outro deputado.
No posto de presidente da Casa desde fevereiro, Rossoni adotou práticas moralizadoras para, segundo ele, sanear os problemas da Assembleia. Entre as medidas que adotou, destacam-se a suspensão de gratificações irregulares, a limitação salarial de diretores e funcionários, e a revisão dos contratos firmados pelo Legislativo, com rompimento daqueles considerados desvantajosos. A economia já chega a R$ 20 milhões, que foram repassados ao governo. Apesar disso, Rossoni não abriu mão da gratificação a que tem direito. Desde que assumiu o comando da Casa, o tucano recebeu R$ 160 mil a mais devido ao benefício.
Problema nacional
O acúmulo de gratificações que ultrapassam o teto constitucional é um problema comum no país. No Executivo, Legislativo e Judiciário há brechas que permitem o pagamento de aposentadorias, abonos, auxílios, diárias e adicional de insalubridade, entre outros. O Planalto tenta regulamentar o teto constitucional. A Casa Civil está preparando um projeto de lei para enviar ao Congresso. A ministra Gleisi Hoffmann, quando assumiu o cargo de senadora, em fevereiro, apresentou um projeto com o mesmo teor.
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