segunda-feira, setembro 16, 2013

As bactérias como fiéis da balança

Dentro de nossos intestinos pode estar parte do segredo da boa forma de algumas pessoas e da dificuldade para emagrecer de outras. No início deste mês, foi divulgado pela revista Science um estudo desenvolvido pelo pesquisador norte-americano Jeffrey Gordon e sua equipe da Universidade de Washington, em Saint Louis, que demonstra como bactérias que formam a microbiota intestinal – também chamada de flora intestinal – conseguem influenciar no peso das pessoas.
A linha de pesquisa não é nova. Há anos os cientistas pesquisam como as bactérias que povoam o intestino humano influenciam no metabolismo. Mas Gordon e sua equipe conseguiram dois avanços: chegaram mais perto de precisar quais são bactérias que dificultam o emagrecimento, quais facilitam esse processo e detectaram como alguns comportamentos alimentares influenciam para o desenvolvimento de cada grupo de bactérias (veja como funcionou o experimento no infográfico desta página).
Experimento
Pesquisa brasileira relaciona flora e sensação de saciedade
O resultado de um estudo desenvolvido no Brasil e ainda não publicado indica que a composição da microbiota intestinal também influencia no comportamento do hipotálamo – que excreta substâncias capazes de gerar sensação de saciedade ou fome. O experimento da nutricionista e doutora em fisiopatologia médica Renata Bagarolli investigou a influência de uma composição específica de probióticos – uma mistura de três cepas de bactérias, a Lactobacillus acidophilus, a Lactobacillus rhamnosus e a Bifidobacterium bifidum – no organismo.
Entre outras coisas, Renata descobriu que nos camundongos tratados com essa mistura houve uma melhora no nível de produção no hipotálamo de substâncias responsáveis pela sensação de saciedade – mecanismo prejudicado em indivíduos obesos. A cientista ainda não sabe explicar exatamente como ocorreu essa influência.
“Ainda precisamos entender como é feita a comunicação entre intestino e hipotálamo. Temos a suspeita de que é via nervo vago [que passa por diversos órgãos, inclusive parte do intestino]”, comenta Renata. Pesquisadora do Laboratório de Investigação em Resistência à Insulina da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, a nutricionista acredita que o uso de bactéria para o tratamento contra a obesidade será uma realidade.
“O estudo identifica o tipo de bactéria que está ligada ao indivíduo gordo e a que está presente no organismo do indivíduo magro”, observa Flávio Quilici, integrante da Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG). O médico explica que a pesquisa demonstrou que algumas bactérias do filo Firmicutis são encontradas com mais frequência em pessoas obesas. Já as do filo Bacteroidetes são ligadas aos organismos magros.
Outro ponto importante demonstrado pela pesquisa de Gordon trata da influência da dieta na composição da microbiota intestinal e, como consequência, no emagrecimento. No estudo se percebeu que os camundongos passaram a desenvolver um maior número de Bacteroidetes – filo das bactérias ligadas à magreza – quando submetidos a uma dieta rica e fibra e com baixo teor de gordura saturada. Por outro lado, quando submetidos a uma alimentação com alto teor de gordura, houve uma dificuldade em se manter a microbiota magra.
Multifatores
Esse aspecto é importante para demonstrar que um possível tratamento contra a obesidade com bactérias – uma possibilidade já considerada pelos cientistas – por si só não operará qualquer milagre. “Claro que a flora é importante, mas temos que tomar cuidado ao colocar isso [o tratamento com bactérias] como uma mágica. Uma dieta equilibrada e exercícios físicos ainda serão necessários para emagrecer”, diz o médico Rogério Toledo Júnior, coordenador do Comissão de Prevenção e Combate à Obesidade, ligada à Associação Médica Brasileira (AMB).
A mesma opinião é compartilhada por outros médicos, inclusive pelos integrantes da equipe de Gordon. Todos alertam que a obesidade é uma doença multifatorial e que, por isso, deve ser tratada em diversas frentes – com mudança de hábitos alimentares e de estilo de vida se mantendo como fatores essenciais. “Temos uma vida sedentária e comemos errado, com uma dieta pobre em frutas e verduras. Assim, não tem bactéria que dê conta”, afirma Quilici.


Probióticos são os micro-organismos vivos que podem trazer benefícios à saúde do hospedeiro. O uso de determinados probióticos para a manutenção de uma microbiota intestinal que favoreça o emagrecimento é considerado por cientistas como uma possibilidade para o combate à obesidade no futuro. Segundo o gastroenterologista Flávio Quilici, os probióticos disponíveis hoje no mercado ainda não conseguem exercer essa função.

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