quinta-feira, abril 05, 2012

Falta de dinheiro mantém jovens na casa dos pais

O casal de arquitetos Gustavo e Cátia, ambos de 25 anos, moram na casa dos pais dele, Hamilton e Rubemyr Chaiben (ao fundo), enquanto juntam dinheiro para com­­prar um apartamento

O desejo dos jovens de sair da casa dos pais em busca da independência esbarra muitas vezes na falta de opções de moradias que se adaptam ao seu orçamento e a suas necessidades. Com poucos recursos e deslocamentos constantes em busca de estudo e trabalho, as pessoas com até 29 anos necessitam de uma oferta habitacional variada, a preço acessível e que atenda às necessidades de moradia e de mobilidade desse público – demandas que nem sempre são atendidas. As conclusões constam em um levantamento divulgado ontem pelo Instituto de Pesquisa Eco­­nômica Aplicada (Ipea).

Segundo o estudo, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Do­­micílios de 2009, do total de pessoas entre 18 e 29 anos que vivem em áreas urbanas no país, 61,7% moram na casa dos pais. O índice é ligeiramente superior ao de 1999, de 60,3%. Entre os dependentes estão tanto jovens solteiros quanto os que constituíram família e continuam morando com os pais.

Alternativa

Saída é ampliar mercado de aluguéis

Uma das soluções para suprir a demanda de moradia dos jovens é oferecer uma maior mobilidade habitacional a eles. A técnica de planejamento e pesquisa do Ipea Maria da Piedade Morais, uma das autoras do estudo, defende essa flexibilidade. “Não é viável uma pessoa se mudar para estudar, assumir a prestação de um imóvel e, seis meses depois, precisar se desfazer dele porque encerrou seus estudos ou arranjou emprego em outra cidade”, afirma.

Uma alternativa, segundo a pesquisadora, seria uma maior oferta do mercado de aluguéis, por exigir um menor compromisso financeiro. Outras opções ainda seriam moradias sociais e aluguéis estudantis, que poderiam contribuir para a redução do déficit habitacional no Brasil, de 5,5 milhões de moradias, completa Maria.

A coabitação familiar – quando duas ou mais famílias moram juntas – é responsável por 40% de todo o déficit. E a maioria destes domicílios com coabitação está na área urbana e regiões metropolitanas, “refletindo um maior custo da terra e da moradia nessas áreas”, aponta o estudo do Ipea.

Qual o seu perfil?

O estudo do Ipea mapeou quais são os fatores que fazem com que os jovens continuem ou não morando na casa dos pais:

Os dependentes

- O fato de o jovem residir em uma região metropolitana ou município de grande porte aumenta a probabilidade de ele ser dependente – reflexo de um mercado habitacional mais caro.

- O jovem tende a permanecer mais tempo na casa dos pais quando eles moram em domicílios próprios regulares.

- Quanto mais elevada a educação do jovem, maior a probabilidade de ele continuar como dependente.

Os independentes

- Os jovens casados e empregados apresentam maior probabilidade de formar um novo domicílio.

- As mulheres são mais propensas a saírem da casa dos pais, muitas vezes visando constituir um possível relacionamento.

- Os aluguéis formais são a principal escolha dos jovens independentes.

- À medida que envelhecem, os jovens são mais propensos à independência. No entanto, a partir de certa idade ocorre justamente o oposto – possivelmente uma situação de “conformismo”, de falta de alternativas ou de assistência dos jovens aos pais idosos.

Apesar do aumento da dependência, a pesquisa mostra que cerca de 70% dos chefes de famílias secundárias entre 21 e 30 anos querem constituir um domicílio independente. Segundo a técnica de planejamento e pesquisa do Ipea Maria da Piedade Morais, uma das autoras do estudo, os jovens não conseguem a independência devido ao alto preço das prestações habitacionais ou por não terem condições financeiras. Também as políticas e condições de aquisição de imóvel não estão compatíveis com as realidades e os objetivos dos mais novos, que em alguns casos preferem dar prioridade aos estudos antes de arcar com prestações da casa própria, diz Maria.

O levantamento analisou ainda o nível de renda, o estado civil e o gênero, que afetam a saída dos jovens de casa. Quanto maior a escolaridade deles, mais tarde conseguem a independência. Tam­­bém a partir de uma idade mais avançada ocorre uma situação de “conformismo” da parte deles para a permanência no lar. O professor da Pontifícia Universidade Ca­­tólica do Paraná (PUCPR) Juliano Amui, mestre em Psicologia Analítica, acrescenta ainda o grande apego familiar como um fator para a dependência.

Nesses casos, a orientação do especialista é que, mesmo dentro da casa dos pais, esse jovem consiga manter uma autonomia. Já para os jovens que constituíram família, a orientação é que eles revejam se não têm condição financeira para constituir um novo lar. “Se está assumindo família, é importante que o jovem reveja esse ponto”, diz Amui. “Se não der, tem de impor limites à interferência dos pais.”

Oferta imobiliária

Uma dificuldade alegada por jovens é a falta de políticas públicas. A Caixa Econômica Federal, por exemplo, não tem uma linha de crédito imobiliária específica para jovens. Segundo a Caixa, porém, eles podem se inserir em outras linhas. Atualmente, 45% dos financiamentos imobiliários são para pessoas de até 35 anos. “O jovem se identifica com as opções que oferecemos”, diz o gerente geral da Caixa em Curitiba, José Amilcar de Lucca Júnior.

O economista especializado no setor imobiliário Fábio Tadeu Araújo é contra políticas públicas específicas por idade. “Se tiver política de incentivo para o jovem, alguém vai pagar por isso e vai penalizar o restante da população.” Segundo Araújo, Curitiba tem uma grande quantidade de imóveis direcionados para os mais novos. A dificuldade, completa, é que às vezes os sonhos deles são incompatíveis com a renda.

Problema é achar imóvel que se encaixe no orçamento

Com o sonho da casa própria e a independência financeira ainda distantes, grande parte dos jovens adia cada vez mais a saída das casas dos pais. Os arquitetos Gustavo Chaiben e Cátia Branco, ambos de 25 anos, se casaram no final do ano passado e desde então dividem um quarto na casa dos pais dele, no bairro Água Verde, em Curitiba.

O jovem casal alega que já está procurando imóvel há um ano, mas ainda não conseguiu achar o apartamento nas condições desejadas nem com uma prestação compatível com o orçamento dos dois. “Pensamos que é melhor adiar um pouco a saída de casa enquanto analisamos bem o mercado. Enquanto isso, estamos juntando dinheiro para poder reduzir as prestações futuras”, conta Gustavo.

Volta ao lar

Muitos jovens até já tentaram a independência financeira, mas, devido aos altos custos, tiveram que voltar para as suas antigas residências. A professora de inglês Ana Rosado, de 30 anos, casou-se há cinco anos e passou a morar com seu marido na época. Três anos mais tarde, eles se separaram e passou a ser inviável para ela bancar uma casa sozinha. Enquanto estava casada, a divisão das contas do lar com o ex-marido tornava a empreitada possível, mas o divórcio fez com que ela precisasse voltar atrás. “Estava fazendo mestrado, então preferi priorizar meus estudos e ter estabilidade financeira voltando para a casa dos meus pais”, explica. Com o fim das aulas neste ano, ela planeja voltar a procurar imóveis.

Mesmo se planejando bastante e procurando intensamente boas condições de imóveis, alguns jovens pensam que o momento atual não é propício para a aquisição destes bens. A técnica de rádio Juliana Caimi, de 27 anos, está nesta busca há três anos. Ela conta que já pensou até em dividir um imóvel com amigos para viabilizar o desejo de morar sozinha, mas diz que mesmo assim não está fácil achar um aluguel ou parcelas que estejam compatíveis com o seu bolso.

Fonte: Gazeta do povo 05/04/2012

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