domingo, fevereiro 16, 2014

Revolução de 1924, os reflexos em Catanduvas e Oeste do PR


O jornal Gazeta do Povo veiculo, em sua edição deste sábado (15), um importante resgate cultural sobre a revolução de 1924, e os reflexos na cidade de Catanduvas e em todo o Oeste do Paraná.

"Passados quase 90 anos do fim do conflito, Catanduvas, no Oeste do Paraná, ainda convive com as trincheiras da guerrilha e estradas usadas na época", relata o jornalistaDiego Antonelli.

"Por cinco meses, a região tornou-se cenário de lutas políticas e militares. Considerada como a “revolução esquecida”, a Revolução de 1924 começou dois anos antes, quando um grupo de militares do Rio de Janeiro se rebelou no Forte de Copacabana", destaca o jornal.

Leia a seguir a íntegra da reportagem:



 REVOLUÇÃO DE 1924
Um Oeste entre trincheiras e balas

Há quase 90 anos, Catanduvas tornava-se palco estratégico do conflito entre revolucionários e legalistas, que deixou cerca de mil mortos

Uma terra marcada até hoje pelas balas que ecoaram durante a Revolução de 1924. Passados quase 90 anos do fim do conflito, Catanduvas, no Oeste do Paraná, ainda convive com as trincheiras da guerrilha e estradas usadas na época. Dois cemitérios são preservados em memória de uma batalha que terminou com quase mil mortos. Há relatos de que por um tempo as serrarias da cidade perdiam suas serras elétricas, pois parte das árvores tinham balas e estilhaços que arrebentavam os equipamentos.

Por cinco meses, a região tornou-se cenário de lutas políticas e militares. Considerada como a “revolução esquecida”, a Revolução de 1924 começou dois anos antes, quando um grupo de militares do Rio de Janeiro se rebelou no Forte de Copacabana.

O Brasil vivia sob o anacronismo da República Velha. O grupo de militares, que deu início ao movimento tenentista, lutava pela moralização política e fim da corrupção eleitoral. Os tenentes estavam indignados com as precariedades das corporações e com a crise que penalizava a classe média, de onde eles eram originados. A ordem era mudar essa lógica e tirar Arthur Bernardes da Presidência do Brasil.

Em 1924, o tenentismo retornou com força em São Paulo, quando Miguel Costa liderou as movimentações – 3,5 mil revolucionários chegaram a assumir o poder da capital paulista por três semanas. Acuados pelo cerco de 14 mil soldados legalistas, saíram de São Paulo, foram escorraçados em Mato Grosso e seguiram para o Paraná.

“Eles chegaram primeiro em Guaíra e depois seguiram para Catanduvas, um ponto estratégico”, relata o historiador Aimoré Índio Arantes. Estratégico porque neste local havia um posto de telégrafo, onde poderiam se comunicar com o resto do Brasil, inclusive com as tropas de Luís Carlos Prestes. Ali seria o local onde a coluna de Miguel Costa se encontraria com a de Prestes, que vinha de Santo Ângelo (RS).

Os revoltos resistiram aos ataques legalistas na espera do reforço de Prestes. “Mas os gaúchos vinham a cavalo. Quando adentraram em território catarinense e paranaense se depararam com florestas densas e um grupo de soldados legalistas, o que atrasou o encontro”, afirma Arantes.

Em março de 1925, os tenentes sem munição, passando necessidades e com sinais dedoenças de pele e respiratórias, renderam-se às tropas do então general Cândido Rondon. Eram quase 1,5 mil revoltosos contra 5 mil soldados legalistas. No final, 407 revolucionários foram presos. Muitos fugiram, como foi o caso de outro líder do movimento, João Cabanas, que se exiliou no Paraguai.

Prestes só chegou ao Paraná em abril de 1925, quando Catanduvas já havia sucumbido. “Um pequeno grupo dos tenentes ainda conseguiu se encontrar com a coluna de Prestes em Foz do Iguaçu”, relata Arantes. Assim, somaram cerca de 1,2 mil homens e deram início à coluna Prestes que por dois anos percorreu 25 mil km no Brasil.

Coluna Prestes se consolidou no Paraná

Apesar do atraso da Coluna Prestes em chegar ao Paraná, alguns integrantes do movimento tenentista paulista conseguiram se aliar aos gaúchos e começaram a percorrer o Brasil. O historiador Renato Carneiro explica que a coluna tinha por finalidade levar ao interior a luta contra o governo e suas ramificações de poder, passando por um total de 13 estados no país de 1925 a 1927. Ele relata ainda que no Paraná a Coluna percorreu cidades da fronteira Oeste.

Foi inclusive nessa região que a Coluna Prestes, propriamente dita, começou – mais precisamente no atual município de Santa Helena. “Foi nessa localidade que as tropas que estavam em Foz do Iguaçu, formadas por gaúchos e paulistas, realmente unificaram as forças”, explica o historiador Aimoré Índio Arantes.

Os líderes rebeldes decidiram realizar a integração dos dois grupos em um único exército, cujo comando ficou dividido entre Miguel Costa e Prestes. A Coluna Prestes – ou Coluna Miguel Costa- Prestes, para alguns – enfrentou frequentes combates com as forças legalistas. Do Paraná, eles seguiram para o atual estado do Mato Grosso do Sul.

Em 1927 já desgastados e sem perspectivas de vitória contra o governo federal, os líderes optaram por encerrar aquela fase do movimento. Muitos dirigiram-se à Bolívia, enquanto Miguel Costa fixou-se na Argentina.

As ações da Revolução de 1924 e, consequentemente, da Coluna Prestes serviram como estimulantes para a Revolução de 1930, que culminou com o fim da chamada República Velha e deu início ao governo de Getúlio Vargas.

Exploração
Revolução também mudou a ocupação da região

O Oeste do Paraná no início do século 20 era tomado por empresas anglo-argentinas que exploravam a erva-mate e, segundo o historiador Adelar Paganini, não pagavam impostos ao Brasil. Muitos trabalhadores brasileiros eram, inclusive, submetidos a condições de trabalho semelhantes às de escravidão. Esse tipo de exploração era realizado pelos chamados obrages. O interesse fundamental de um “obrahero” não era a colonização nem povoamento e sim a extração da erva mate, nativa da região, bem como da madeira da mata nativa.

Paganini salienta que com a chegada dos revoltosos de 1924 e o fim da revolução, o governo federal passou a dar atenção para região e iniciou a colonização com colonos do Sul do país. “E as empresas estrangeiras foram despojadas das terras que sempre pertenceram à União”, afirma o historiador, que trabalha no Memorial da Revolução de 1924, em Catanduvas.

Com isso, trabalhadores e empresas brasileiras foram assumindo o controle dos negócios, principalmente com a chegada de colonos de Santa Catarina e também do Rio Grande do Sul, que contribuíram para povoar e contribuir para a colonização do território.

Já com Getúlio Vargas no poder, começou a chamada Marcha para o Oeste, que buscava colonizar regiões praticamente desocupadas, próximas de fronteiras, como o Oeste e Sudoeste do Paraná.

Memorial

Em Catanduvas, desde 2012, há o Memorial da Revolução de 1924. A ideia, segundo o historiador e um dos curadores do espaço, Renato Carneiro, é dotar a cidade de um equipamentos cultural multiuso que possa oferecer a oportunidade de conhecer a realidade histórica da região, palco de uma revolução sangrenta e atos de heroísmo.

A prefeitura do município é responsável pela administração do espaço cultural, que foi construído pelo governo do Estado em 2010. Carneiro explica, porém, que o memorial ficou fechado até 2012, “pois só havia sido edificado o prédio, sem a montagem museológica que se previa”.

Foto: Reprodução
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