domingo, agosto 05, 2012

A eleição da classe C

Segmento emergente ainda não percebe os efeitos práticos da política como sente os do consumo. Ainda assim, pode ser decisivo na disputa deste ano



Cerca de metade da classe média tradicional brasileira está chateada com o aumento da fila nos cinemas (62,8%), quer produtos com versões diferentes para ricos e pobres (55,3%) e acha que a qualidade dos serviços piorou pelo aumento da demanda (48,4%). O motivo: tem mais gente com dinheiro para consumir o que antes era restrito a poucos abonados.
A má notícia para os descontentes é que esse pessoal, a nova classe média ou classe C, se consolidou como a maioria da população em Curitiba, no Paraná e no Brasil – e, por consequência, tem cada vez mais peso para decidir sozinha quem deve administrar o município, o estado e o país.

Fala, povo
O que pensa a classe C

Fotos: Felipe Rosa/ Gazeta do Povo
 
“No bairro onde eu moro o maior problema é a falta de segurança. É complicado viver lá por causa dos assaltos, moradores de rua e falta de controle de drogas.” Messias Santos, motorista, 47 anos, morador da CIC
“O próximo prefeito tem que implantar serviços de combate às drogas, espalhadas na cidade, aumentar o número de postos de saúde e aumentar o salário dos médicos para garantir a permanência deles no sistema público.” Marcelo Nagashima, bancário, 44 anos, morador do Cajuru
“O grande problema da cidade é a saúde pública. Minha tia faleceu dentro do pronto-socorro por falta de atendimento.” Daniele Soares, 23 anos, moradora do Sítio Cercado
“Em Curitiba a saúde pública é precária e o problema de segurança ainda não foi resolvido, mesmo com a instalação das UPSs, que ainda não atingem as regiões mais perigosas.”. Marcelo Henrique, vigilante, 24 anos, morador da Vila Hauer
As reclamações foram captadas por uma pesquisa do Data Popular, consultoria especializada no comportamento desses emergentes. O mesmo estudo, feito no ano passado, também elencou os oito principais valores na nova classe média. Pelo menos três deles são essenciais para entender como o grupo encara a política: a ligação com o bairro e a vizinhança, a batalha para educar os filhos e a tomada de de­­cisões a partir de informações e opiniões de confiança.
Assim como a elite, no entanto, os políticos em geral também não en­­tendem a nova classe média. “Existe uma dissonância cognitiva. O que é curioso é que a nova classe média se integra bem melhor com a iniciativa privada do que com o poder público e os políticos em geral”, diz o sócio-diretor do Data Popular, Wagner Sarnelli.
O problema, segundo ele, está ligado ao fato de que as pessoas que deixaram as classes D e E não sentem os efeitos práticos da política como sentem os do consumo. Além disso, a maioria vê a política com um aborrecimento.
Sarnelli cita dados sobre otimismo do Data Popular para justificar a tese. Nas regiões Sul e Sudeste, onde os emergentes são considerados por ele como mais politizados, três a cada quatro representantes da nova classe média acreditam que a vida vai melhorar no futuro, enquanto no Norte e Nordeste a proporção dos otimistas é de quase nove para dez.
Outro motivo para o dis­­tanciamento da política é temporal. Especialista em pesquisas eleitorais, a cientista política da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Luciana Veiga diz que é necessário dissociar o comportamento da nova classe média na hora de votar e na de consumir. “A classe C de hoje já estava inserida no processo eleitoral quando fazia parte das classes D e E. A mudança de comportamento político é muito mais lenta que o de comportamento de consumo”, opina a pesquisadora.
Números do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV) comprovam que a classe C cresce constantemente desde meados dos anos 1990, mas só atingiu a maioria da população brasileira em 2009 (veja as informações no infográfico). Por outro lado, as eleições diretas para prefeito já haviam sido retomadas em 1985.
A falta de identificação com a política tradicional, contudo, não quer dizer que a nova classe média está alheia ao processo eleitoral. Consultor político e professor de Comunicação Política da Universidade de São Paulo, Gaudêncio Tor­­quato define a lógica de escolha dos emergentes como uma questão de “geográfica corporal”. Segundo ele, o mapa da decisão começa no bolso, passa pelo estômago, chega ao coração e termina no cérebro.
Ou seja, a partir do momento em que as questões básicas de sobrevivência estiverem resolvidas, as decisões eleitorais da nova classe média serão mais elaboradas. Torquato ressalta que a ascensão social só faz bem à democracia brasileira. “O acesso ao consumo que essas pessoas tiveram nos últimos anos leva inevitavelmente a uma absorção de novos conhecimentos e à elevação dos seus padrões de cidadania”, diz o consultor.
Os prognósticos dele são imediatistas. Para Torquato, as disputas municipais de 2012 serão as eleições da classe C. “O candidato que souber entrar na micropolítica da nova classe média, dedicar-se às questões locais, com certeza é o que vai ter mais sucesso.”

FONTE , GAZETA DO POVO


http://www.gazetadopovo.com.br





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