quarta-feira, janeiro 04, 2012

Dois terços dos mandados não são cumpridos no Paraná

Falta de efetivo policial e de estrutura para receber novos presos revela ineficiência dos órgãos de segurança em atender às demandas do Judiciário

Entre as 87 ordens de prisão diárias emitidas por juizados criminais e de Família do estado, somente 29 foram cumpridas pela polícia

A cada três mandados de prisão emitidos pelaJustiça estadual no último ano, dois deixaram de ser cumpridos pela polícia no Paraná. Segundo levantamento do Tribunal de Justiça do estado (TJ-PR), entre 20 de dezembro de 2010 e 30 de novembro de 2011, juizados criminais e de Família do estado emitiram uma média de 87 ordens de prisão por dia – enquanto, no mesmo período, a média diária de cumprimentos pela polícia foi de 29 mandados. Caso seguissem no mesmo ritmo deste ano, policiais civis, militares, guardas municipais e agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) demorariam um ano e três meses para conseguir cumprir o total de ordens de prisão pendentes, que no começo do mês passado chegava a exatos 34.793 mandados.

O balanço do TJ-PR leva em conta o número de ordens emitidas após a implantação do primeiro e ainda único sistema eletrônico do país que permite o envio pela internet dos mandados para os órgãos de segurança. Além de agilizar o processo, o sistema também facilita a produção de estatísticas que comprovam o que é sentido na prática: a ineficiência dos órgãos de segurança em atender às demandas do Judiciário. Se, por um lado, faltam policiais para buscar foragidos, por outro, não há vagas no sistema prisional para abrigar a imensidão de procurados. Para receber as 34,7 mil pessoas que têm mandados de prisão em aberto, por exemplo, seria necessário mais do que dobrar o atual número de vagas nas penitenciárias do Paraná, que chegam hoje a 14,4 mil.

Segundo o TJ-PR, a tendência é que a diferença entre emissão e cumprimentos diminua no decorrer do próximo ano, já que, com a implantação do novo sistema em 2010, vários mandados antigos foram “renovados” para poderem constar no novo banco de dados – o que inflou os números temporariamente – trabalho que já se encerrou. No entanto, esses números poderiam ser ainda maiores caso o levantamento do Tribunal de Justiça considerasse também os mandados emitidos por outras instâncias, como a Justiça Federal, e outros estados, para cumprimento no Paraná.

Engessamento

O presidente do Sindicato das Classes Policiais Civis do Estado do Paraná (Sinclapol), André Gutierrez, reconhece que os números traduzem uma realidade histórica vivenciada pelos agentes de segurança. Apesar do TJ-PR não ter o balanço da “idade” dos mandados, Gutierrez garante que não são raras as ordens que “não são cumpridas nunca”. “Faltam estrutura e valorização da atividade policial”, afirma.

Para a vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), Isabel Kugler Mendes, a prisão dos foragidos esbarra principalmente na realidade das cadeias e penitenciárias do estado, superlotadas. “Os juízes cumprem suas obrigações mas não há condições”, avalia.

Banco de ordens está previsto para este mês

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pretende implantar até 16 de janeiro o Banco Nacional de Mandados de Prisão (BNMP), que, a exemplo do sistema paranaense, deve agilizar a emissão e cumprimentos de mandados em todo o país. A medida, anunciada como complemento às ações dos mutirões carcerários feitos desde o ano passado, também terá como objetivo facilitar a comunicação entre os estados, permitindo que um fugitivo paranaense, por exemplo, seja localizado e detido em outras regiões do Brasil.

Em um primeiro momento, apenas os novos mandados de prisão emitidos pela Justiça após janeiro serão cadastrados no sistema. Já os mandados antigos e ainda em vigência serão registrados no banco ao longo do primeiro semestre de 2012 – menos no Paraná, onde as ordens já foram cadastradas ao longo do ano.

Segundo o CNJ, o banco, que será alimentado pelos juízes, conterá dados pessoais dos procurados, como número do documento e filiação, além de fotografia. Só serão publicados no sistema aqueles não cumpridos e sem caráter sigiloso. E, nos casos de operações policiais que exigem cumprimento simultâneo de vários mandados de prisão, os juízes podem optar por não disponibilizar as informações, para não prejudicar o andamento dos trabalhos.

A ressalva já foi adiantada pelo CNJ justamente devido ao caráter público do banco: todas as informações estarão disponíveis não só para os juízes e órgãos de segurança, mas também para a população em geral, pela internet. Os dados poderão ser acessados mesmo sem cadastro prévio.

A publicidade das informações tem despertado opiniões diversas de juristas e policiais, que temem interpretações equivocadas dos documentos presentes no banco, principalmente quando se tratar de mandados processuais – quando a pessoa citada ainda não foi julgada e condenada.

“A pessoa leiga tem dificuldade de entender que existem diferentes níveis de prisão. É preciso levar em conta o princípio do estado de inocência, de que ninguém é considerado culpado até que haja uma decisão em definitivo”, afirma o juiz-auxiliar da Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) Roberto Luiz Santos Negrão.

"FONTE" GAZETA DO POVO

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